Constitui prática comercial abusiva o envio de cartão de crédito sem prévia e expressa solicitação do consumidor, configurando-se ato ilícito indenizável e sujeito à aplicação de multa administrativa. Corte Especial, aprovada em 3/6/2015, DJe 8/6/2015.
A incidência de atualização monetária nas indenizações por morte ou invalidez do seguro DPVAT, prevista no § 7º do art. 5º da Lei 6.194/1974, redação dada pela Lei 11.482/2007, opera-se desde a data do evento danoso. Com a edição da MP 340/2006, desvinculou-se a indenização do seguro DPVAT do salário mínimo, estabelecendo-a no valor fixo de R$ 13.500,00 para os casos de invalidez ou morte. Após a conversão da MP na Lei 11.482/2007 - dando nova redação à Lei 6.194/1974 -, surgiu controvérsia sobre a existência de uma lacuna legislativa acerca do termo inicial da correção monetária das indenizações. Passou-se a discutir, então, se haveria efetivamente uma lacuna legislativa ou um silêncio eloquente do legislador ou, até mesmo, uma inconstitucionalidade por omissão. Sob o fundamento de inconstitucionalidade da MP 340/2006, foram ajuizadas ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) perante o STF. De outro lado, sob o argumento de silêncio eloquente do legislador, as seguradoras interessadas passaram a se opor à pretensão de reajuste do valor da indenização. Por sua vez, sob o fundamento da existência de lacuna legislativa, várias demandas foram ajuizadas, pleiteando-se a sua colmatação pelo Poder Judiciário, com base no art. 4º da LINDB. Nesta linha de intelecção, a correção monetária poderia incidir a partir da publicação da MP 340/2006, porquanto a atualização não importaria acréscimo no valor originário. Ocorre que o STF, no julgamento da ADI 4.350-DF (DJe 3/12/2014), rejeitou a alegação de inconstitucionalidade sob o fundamento de que a lei não contém omissão. Desse modo, esse entendimento há de ser seguido pelo STJ, não havendo espaço para a controvérsia estabelecida no plano infraconstitucional. Assim, deverá ser seguida a forma de atualização monetária prevista no § 7º do art. 5º da Lei 6.194/1974, com a redação dada pela Lei 11.482/2007, considerando a data do evento danoso como termo inicial da correção, na linha da jurisprudência pacificada no STJ. Precedentes citados: AgRg no AREsp 46.024-PR, Terceira Turma, DJe 12/3/2012; AgRg no REsp 1.480.735-SC, Quarta Turma, DJe 30/10/2014; e AgRg no REsp 1.482.716-SC, Terceira Turma, DJe 16/12/2014. REsp 1.483.620-SC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 27/5/2015, DJe 2/6/2015.
Na execução de sentença que reconhece o direito de poupadores aos expurgos inflacionários decorrentes do Plano Verão (janeiro de 1989), incidem os expurgos inflacionários posteriores a título de correção monetária plena do débito judicial, que terá como base de cálculo o saldo existente ao tempo do referido plano econômico, e não os valores de eventuais depósitos da época de cada plano subsequente. De início, cumpre diferenciar duas situações que parecem se baralhar com relativa frequência: (i) uma é a incidência de expurgos inflacionários resultantes de planos econômicos não previstos na sentença coletiva a valores eventualmente existentes em contas de poupança em momento posterior; (ii) outra é a incidência, no débito judicial resultante da sentença, de expurgos inflacionários decorrentes de planos econômicos posteriores ao período apreciado pela ação coletiva, a título de correção monetária plena da dívida consolidada. Exemplo da primeira situação: em janeiro de 1989, um poupador detinha determinado valor depositado em poupança e manteve a conta aberta com valores passados e/ou futuros até a atualidade; a sentença coletiva reconhece o direito à diferença de correção monetária referente a janeiro de 1989 (Plano Verão) e o correntista busca, na execução da sentença, a incidência de outros expurgos aos valores que foram ou se mantiveram depositados na conta; nessa hipótese, a depender do caso concreto, certamente poderá haver ofensa à coisa julgada com a inclusão de expurgos - posteriores à sentença -, na fase de execução. Em relação à segunda situação, tem-se o seguinte exemplo: em janeiro de 1989, um poupador detinha determinado valor depositado em poupança; a sentença coletiva reconhece o direito à diferença de correção monetária referente a janeiro de 1989 (Plano Verão); sobre esse débito certo e reconhecido (fixado conforme o título), referente ao direito a expurgos inflacionários concretamente decididos na sentença, a parte, na fase de execução, busca a incidência de outros expurgos referentes a planos econômicos posteriores, mas tudo a título de correção monetária do débito reconhecido. Percebe-se que as bases de cálculo de cada situação são bem distintas: na primeira, a base de cálculo é o saldo dos depósitos existentes à época de cada plano econômico; na segunda, é o saldo existente em conta em janeiro de 1989, que é atualizado na fase de execução, fazendo-se incidir os demais expurgos referentes aos planos econômicos não contemplados na sentença. No caso em análise - situação (ii) -, observa-se que o propósito subjacente é a mera recomposição da moeda, mediante incidência de correção monetária plena. No ponto, é de longa data a jurisprudência do STF e do STJ no sentido de que a correção monetária não consubstancia acréscimo material ao débito principal, mas mera recomposição do valor real em face da corrosão inflacionária de determinado período. Por essa ótica, havendo um montante fixo já definido na sentença - dependente apenas de mero cálculo aritmético -, não hostiliza a coisa julgada a inclusão, na fase de execução individual, de correção monetária não contemplada na sentença . Antes, a protege, pois só assim o título permanece hígido com a passagem do tempo em um cenário econômico no qual a inflação não é nula. Com efeito, se, para a manutenção da coisa julgada, é necessário proceder à correção monetária plena do débito reconhecido, os expurgos inflacionários do período de inadimplemento devem compor o cálculo, estejam ou não contemplados na sentença exequenda. Precedentes citados: REsp 1.322.543-DF, Quarta Turma, julgado em 26/8/2014, DJe 16/9/2014; AgRg no REsp 1.240.114-SC, Terceira Turma, DJe 18/3/2014; e REsp 550.063-PR, Segunda Turma, DJe 23/4/2010. REsp 1.314.478-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 13/5/2015, DJe 9/6/2015.
É de perigo abstrato o crime previsto no art. 310 do Código de Trânsito Brasileiro. Assim, não é exigível, para o aperfeiçoamento do crime, a ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na conduta de quem permite, confia ou entrega a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou ainda a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança. Ao contrário do que estabelece o crime imediatamente anterior (art. 309), ou mesmo o posterior (art. 311), nos quais o tipo exige que a ação se dê "gerando perigo de dano", não há tal indicação na figura delitiva prevista no art. 310. Pode parecer uma incoerência que se exija a produção de perigo de dano para punir quem dirige veículo automotor, em via pública, sem a devida Permissão para Dirigir ou Habilitação (art. 309) e se dispense o risco concreto de dano para quem contribui para tal conduta, entregando o automóvel a quem sabe não habilitado ou, o que é pior, a quem notoriamente não se encontra em condições físicas ou psíquicas, pelas circunstâncias indicadas no tipo penal, de conduzir veículo automotor. Duas considerações, porém, enfraquecem essa aparente contradição. Em primeiro lugar, o legislador foi claro, com a redação dada aos arts. 309 e 311, em não exigir a geração concreta de risco na conduta positivada no art. 310. Poderia fazê-lo, mas preferiu contentar-se com a deliberada criação de um risco para um número indeterminado de pessoas por quem permite a outrem, nas situações indicadas, a condução de veículo automotor em via pública. Em segundo lugar, não há total identidade das situações previstas nos arts. 309 e 310. Naquela, cinge-se o tipo a punir quem dirige sem habilitação; nesta, pune-se quem permite, confia ou entrega a direção de veículo automotor tanto a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso quanto a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança. Trata-se, na verdade, de uma visão que deve repousar mais corretamente no incremento do risco ocasionado com a entrega da direção de veículo para pessoa não habilitada ou em quaisquer das outras hipóteses legais. Conforme entendimento doutrinário, em todas essas situações, a definição do risco permitido delimita, concretamente, o dever de cuidado para realizar a ação perigosa de dirigir veículo automotor em vias urbanas e rurais, explicando o atributo objetivo contido no dever de cuidado objetivo. A violação da norma constitui a criação de um risco não permitido, culminando, com o desvalor da ação, na lesão ao dever de cuidado objetivo. Por todo exposto, afigura-se razoável atribuir ao crime materializado no art. 310 a natureza de crime de perigo abstrato, ou, sob a ótica ex ante, de crime de perigo abstrato-concreto, em que, embora não baste a mera realização de uma conduta, não se exige, a seu turno, a criação de ameaça concreta a algum bem jurídico e muito menos lesão a ele. Basta a produção de um ambiente de perigo em potencial, em abstrato, de modo que a atividade descrita no tipo penal crie condições para afetar os interesses juridicamente relevantes, não condicionados, porém, à efetiva ameaça de um determinado bem jurídico. Embora seja legítimo aspirar a um Direito Penal de mínima intervenção, não pode a dogmática penal descurar de seu objetivo de proteger bens jurídicos de reconhecido relevo, assim entendidos, na dicção de Claus Roxin, como "interesses humanos necessitados de proteção penal", qual a segurança do tráfego viário. Não se pode, assim, esperar a concretização de danos ou exigir a demonstração de riscos concretos a terceiros para a punição de condutas que, a priori, representam potencial produção de danos a pessoas indeterminadas, que trafeguem ou caminhem no espaço público. O subsistema social do tráfego viário exige o respeito a regras de observância generalizada, sem o qual se enfraquece o princípio da confiança (aqui entendido, conforme o pensamento de Roxin, como princípio de orientação capaz de indicar os limites do cuidado objetivo esperado ou do risco permitido), indispensável para o bom funcionamento do trânsito e a segurança de todos. Não se exclui, por óbvio, a possibilidade de ocorrerem situações nas quais a total ausência de risco potencial à segurança viária afaste a incidência do direito penal, como se poderia concluir do exemplo de quem, desejando carregar uma caminhonete com areia, pede ao seu ajudante, não habilitado, que realize uma manobra de poucos metros, em área rural desabitada e sem movimento, para melhor posicionar a carroceria do automóvel. Faltaria tipicidade material a tal comportamento, absolutamente inidôneo para pôr em risco a segurança de terceiros. Portanto, na linha de entendimento de autorizada doutrina, o art. 310, mais do que tipificar uma conduta idônea a lesionar, estabelece um dever de garante ao possuidor do veículo automotor. Neste caso, estabelece-se um dever de não permitir, confiar ou entregar a direção de um automóvel a determinadas pessoas, indicadas no tipo penal, com ou sem habilitação, com problemas psíquicos ou físicos, ou embriagadas, ante o perigo geral que encerra a condução de um veículo nessas condições. Precedentes citados: RHC 48.817-MG, Quinta Turma, DJe 28/11/2014; e AgRg no RHC 41.922-MG, Quinta Turma, DJe 15/4/2014. REsp 1.485.830-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 11/3/2015, DJe 29/5/2015.
A existência de sistema de segurança ou de vigilância eletrônica não torna impossível, por si só, o crime de furto cometido no interior de estabelecimento comercial. O crime impossível - subordinado às regras da adequação típica - se manifesta por meio de duas modalidades clássicas (art. 17 do CP): (a) a ineficácia absoluta dos meios empregados pelo agente e (b) a absoluta impropriedade do objeto. A primeira decorre dos meios empregados pelo agente nos atos executivos. A segunda refere-se à hipótese em que o objeto do crime não existe ou lhe falta alguma qualidade imprescindível para configurar-se a infração. No tocante à primeira modalidade (em torno da qual surge a discussão aqui enfrentada), há que se distinguir a insuficiência do meio (inidoneidade relativa) - deficiência de forças para alcançar o fim delituoso e determinada por razões de qualidade, quantidade, ou de modo - da ausência completa de potencialidade causal (inidoneidade absoluta), observando-se que a primeira (diferentemente da segunda) não torna absolutamente impossível o resultado que consuma o delito, pois o fortuito pode suprir a insuficiência do meio empregado. No caso de furto praticado no interior de estabelecimento comercial guarnecido por mecanismo de vigilância e de segurança, tem-se que, embora os sistemas eletrônicos de vigilância tenham por objetivo evitar a ocorrência de furtos, sua eficiência apenas minimiza as perdas dos comerciantes, visto que não impedem, de modo absoluto, a ocorrência de subtrações no interior de estabelecimentos comerciais. Ora, não se pode afirmar, em um juízo normativo de perigo potencial, que o equipamento funcionará normalmente, que haverá vigilante a observar todas as câmeras durante todo o tempo, que as devidas providências de abordagem do agente serão adotadas após a constatação do ilícito etc. Conquanto se possa crer que, sob a perspectiva do que normalmente acontece, na maior parte dos casos o agente não logrará consumar a subtração de produtos do interior do estabelecimento comercial guarnecido por mecanismos de vigilância e de segurança, sempre haverá o risco de que providências tomadas, por qualquer motivo, não frustrem a ação delitiva. Além disso, os atos do agente não devem ser apreciados isoladamente, mas em sua totalidade, uma vez que o criminoso pode se valer de atos inidôneos no início da execução, mas ante a sua indiscutível inutilidade, passar a praticar atos idôneos. Portanto, na hipótese aqui analisada, o meio empregado pelo agente é de inidoneidade relativa, visto que há possibilidade (remota) de consumação do delito. Sendo assim, se a ineficácia do meio deu-se apenas de forma relativa, não é possível o reconhecimento do instituto do crime impossível previsto no art. 17 do CP. REsp 1.385.621-MG, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 27/5/2015, DJe 2/6/2015.
Deve ser suspensa a execução da decisão liminar (art. 25, § 3º, da Lei 8.038/1990) proibitiva de desconto salarial dos dias de paralisação decorrentes de greve dos professores do Estado de São Paulo, movimento paredista que durava mais de 60 dias até a análise do pedido de suspensão de segurança, sem êxito nas tentativas de acordo e sem notícia de decisão judicial sobre as relações obrigacionais entre grevistas e o Estado, e que, além disso, já havia levado ao dispêndio de vultosos recursos na contratação de professores substitutos, como forma de impedir a iminente interrupção da prestação do serviço público educacional do Estado. Nessa situação, encontra-se configurada grave lesão à ordem e à economia pública do referido Estado. Com efeito, evidenciam-se danos aos cofres públicos decorrentes da possibilidade de dispêndio de vultosos valores com o pagamento dos dias parados, somados ao considerável montante gasto com a contratação de professores temporários em substituição aos servidores grevistas, de modo a evitar a iminente interrupção do já notoriamente precário ensino público, serviço cuja fundamentalidade é reconhecida pela CF. Na situação em análise, cabe ressaltar, a decisão autorizativa do corte não atenta contra o direito constitucional a greve. A propósito, o STF já concluiu que, "nos termos do art. 7º da Lei n. 7.783/1989, a deflagração da greve, em princípio, corresponde à suspensão do contrato de trabalho. Na suspensão do contrato de trabalho não há falar propriamente em prestação de serviços, nem tampouco no pagamento de salários. Como regra geral, portanto, os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento ou por outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de trabalho." (STA 207-RS, DJ 8/4/2008). Trata-se, na verdade, da necessária ponderação que deve ser feita entre o regular exercício do direito de greve e o direito à prestação dos serviços públicos fundamentais. E o fato é que, na perspectiva do exame da grave lesão à ordem pública e econômica, vislumbra-se sério risco a justificar a concessão da medida de contracautela na hipótese que ora se analisa. O STJ, inclusive, já manifestou o entendimento de que "a deflagração do movimento grevista suspende, no setor público, o vínculo funcional e, por conseguinte, desobriga o Poder Público do pagamento referente aos dias não trabalhados" e de que a "existência de acordo, convenção coletiva, laudo arbitral ou decisão judicial regulando as relações obrigacionais decorrentes do movimento paredista pode prever a compensação dos dias de greve (ex vi do art. 7º, in fine, da Lei nº 7.783/89). Todavia, à míngua dessas tratativas, não há direito líquido e certo dos servidores sindicalizados a ser tutelado na via mandamental, já que, nesses casos, deve prevalecer o poder discricionário da Administração, a quem cabe definir pelo desconto, compensação ou outras maneiras de administrar o conflito, sem que isso implique qualquer ofensa aos princípios da proporcionalidade ou razoabilidade" (MS 17.405-DF, Corte Especial, DJe 9/5/2012). Ademais, no STJ já foi deferida suspensão de segurança em caso análogo, no qual ficou consignado que "no setor público, o Brasil tem enfrentado greves que se arrastam por meses. Algumas com algum sucesso, ao final. Outras sem consequência qualquer para os servidores. O público, porém, é sempre penalizado. A lei nº 7.783, de 1989, se aplica, no que couber, ao setor público. Salvo melhor juízo, a decisão administrativa que determina o desconto em folha de pagamento dos servidores grevistas é compatível com o regime da lei. A que limite estará sujeita a greve, se essa medida não for tomada? Como compensar faltas que se sucedem por meses?" (SS 2.606-DF, decisão monocrática, DJe 7/8/2012). E não é outra a situação aqui enfrentada: a manifestação grevista, até a análise do pedido de suspensão da segurança, durava mais de 60 dias e não lograram êxito as tentativas de conciliação realizada entre governantes e membros do movimento paredista. Ressalte-se, por oportuno, que qualquer argumentação que envolva a discussão sobre a legalidade ou ilegalidade da greve deve ser discutida na seara recursal própria. AgRg na SS 2.784-SP, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 3/6/2015, DJe 12/6/2015.
O recolhimento, no ato da interposição do recurso, de apenas uma das verbas indispensáveis ao seu processamento (custas, porte de remessa e retorno, taxas ou outras) acarreta a intimação do recorrente para suprir o preparo no prazo de cinco dias, e não deserção. Isso porque a norma do § 2º do art. 511 do CPC, acrescentado pela Lei 9.756/1998, diz respeito à "insuficiência no valor do preparo", não das custas ou do porte de remessa e retorno ou de taxas separadamente. Nesse sentido, reafirmando o conceito adotado na pacífica e antiga jurisprudência - ainda aplicada até mesmo no STF -, invoca-se entendimento doutrinário segundo o qual "o valor do preparo é o da soma, quando for o caso, da taxa judiciária e das despesas postais (portes de remessa e de retorno dos autos)". Com isso, recolhido tempestivamente algum dos componentes do preparo, incide a norma do § 2º do art. 511 do CPC, que permite sua complementação mediante a quitação de outros valores, mesmo com natureza distinta. Ademais, possuindo a lei o claro propósito de mitigar o rigor no pagamento do preparo, admitindo sua complementação diante da boa-fé e da manifestação inequívoca de recorrer, descabe ao Poder Judiciário impor requisitos ou criar obstáculos não previstos e que, principalmente, possam toldar a razão da lei. Em suma, se a norma do § 2º do art. 511 do CPC foi editada com o propósito de viabilizar a prestação jurisdicional, permitindo a complementação do "preparo" em sua concepção ampla, tem-se que o recolhimento apenas das custas ou do porte de remessa e retorno, ou de alguma outra taxa recursal, representa preparo insuficiente, sendo tal entendimento o que melhor se coaduna com a tradicional jurisprudência do STJ, com o objetivo da própria Lei 9.756/1998 e com o ideal de acesso à justiça. REsp 844.440-MS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 6/5/2015, DJe 11/6/2015.
Deve ser suspensa a ação reivindicatória de bem imóvel, pelo prazo máximo de um ano (art. 265, IV, "a", do CPC), enquanto se discute, em outra ação, a nulidade do próprio negócio jurídico que ensejou a transferência do domínio aos autores da reivindicatória. Isso porque, nessa situação, está configurada a prejudicialidade externa entre as ações, de modo que, nos termos do art. 265, IV, "a", do CPC, deve o juiz decretar a suspensão do processo quando houver questão prejudicial (externa) cuja solução é pressuposto lógico necessário da decisão que estará contida na sentença. Na espécie, constata-se que tanto a ação anulatória como a reivindicatória estão dirigidas ao mesmo bem imóvel. Dessa forma, tem-se, sem dúvida, prejudicialidade do resultado do julgamento da ação anulatória em relação à reivindicatória, pois, acaso procedente aquela, faltará legitimidade ativa ad causam aos autores desta, justificando-se a suspensão da ação reivindicatória pelo prazo máximo de um ano, nos termos do § 5º do art. 265 do CPC. Precedente citado: AgRg no REsp 1.151.040-RJ, Quarta Turma, DJe de 22/2/2012. EREsp 1.409.256-PR, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 6/5/2015, DJe 28/5/2015.
A União não tem legitimidade passiva em ação de indenização por danos decorrentes de erro médico ocorrido em hospital da rede privada durante atendimento custeado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Isso porque, de acordo com o art. 18, X, da Lei 8.080/1990, compete ao município celebrar contratos e convênios com entidades prestadoras de serviços privados de saúde, bem como controlar e avaliar a respectiva execução. Nesse contexto, não se deve confundir a obrigação solidária dos entes federativos em assegurar o direito à saúde e garantir o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação, com a responsabilidade civil do Estado pelos danos causados a terceiros. Nesta, o interessado busca uma reparação econômica pelos prejuízos sofridos, de modo que a obrigação de indenizar se sujeita à comprovação da conduta, do dano e do respectivo nexo de causalidade. Dessa forma, não há qualquer elemento que autorize a responsabilização da União, seja porque a conduta não foi por ela praticada, seja em razão da impossibilidade de aferir-se a existência de culpa in eligendo ou culpa in vigilando. Precedentes citados: AgRg no CC 109.549-MT, Primeira Seção, DJe 30/6/2010; e REsp 992.265-RS, Primeira Turma, DJe 5/8/2009. EREsp 1.388.822-RN, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 13/5/2015, DJe 3/6/2015.
O cônjuge sobrevivente casado sob o regime de comunhão parcial de bens concorrerá com os descendentes do cônjuge falecido apenas quanto aos bens particulares eventualmente constantes do acervo hereditário. O art. 1.829, I, do CC estabelece que o cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes do falecido, salvo se casado: i) no regime da comunhão universal; ou ii) no da separação obrigatória de bens (art. 1.641, e não art. 1.640, parágrafo único); ou, ainda, iii) no regime da comunhão parcial, quando o autor da herança não houver deixado bens particulares. Com isso, o cônjuge supérstite é herdeiro necessário, concorrendo com os descendentes do morto, desde que casado com o falecido no regime: i) da separação convencional (ou consensual), em qualquer circunstância do acervo hereditário (ou seja, existindo ou não bens particulares do falecido); ou ii) da comunhão parcial, apenas quando tenha o de cujus deixado bens particulares, pois, quanto aos bens comuns, já tem o cônjuge sobrevivente o direito à meação, de modo que se faz necessário assegurar a condição de herdeiro ao cônjuge supérstite apenas quanto aos bens particulares. Dessa forma, se o falecido não deixou bens particulares, não há razão para o cônjuge sobrevivente ser herdeiro, pois já tem a meação sobre o total dos bens em comum do casal deixados pelo inventariado, cabendo a outra metade somente aos descendentes deste, estabelecendo-se uma situação de igualdade entre essas categorias de herdeiros, como é justo. Por outro lado, se o falecido deixou bens particulares e não se adotar o entendimento ora esposado, seus descendentes ficariam com a metade do acervo de bens comuns e com o total dos bens particulares, em clara desvantagem para o cônjuge sobrevivente. Para evitar essa situação, a lei estabelece a participação do cônjuge supérstite, agora na qualidade de herdeiro, em concorrência com os descendentes do morto, quanto aos bens particulares. Assim, impõe uma situação de igualdade entre os interessados na partilha, pois o cônjuge sobrevivente permanece meeiro em relação aos bens comuns e tem participação na divisão dos bens particulares, como herdeiro necessário, concorrendo com os descendentes. A preocupação do legislador de colocar o cônjuge sobrevivente na condição de herdeiro necessário, em concorrência com os descendentes do falecido, assenta-se na ideia de garantir ao cônjuge supérstite condições mínimas para sua sobrevivência, quando não possuir obrigatória ou presumida meação com o falecido (como ocorre no regime da separação convencional) ou quando a meação puder ser até inferior ao acervo de bens particulares do morto, ficando o cônjuge sobrevivente (mesmo casado em regime de comunhão parcial) em desvantagem frente aos descendentes. Noutro giro, não se mostra acertado o entendimento de que deveria prevalecer para fins sucessórios a vontade dos cônjuges, no que tange ao patrimônio, externada na ocasião do casamento com a adoção de regime de bens que exclua da comunhão os bens particulares de cada um. Com efeito, o regime de bens tal qual disciplinado no Livro de Família do Código Civil, instituto que disciplina o patrimônio dos nubentes, não rege o direito sucessório, embora tenha repercussão neste. Ora, a sociedade conjugal se extingue com o falecimento de um dos cônjuges (art. 1.571, I, do CC), incidindo, a partir de então, regras próprias que regulam a transmissão do patrimônio do de cujus, no âmbito do Direito das Sucessões, que possui livro próprio e específico no Código Civil. Assim, o regime de bens adotado na ocasião do casamento é considerado e tem influência no Direito das Sucessões, mas não prevalece tal qual enquanto em curso o matrimônio, não sendo extensivo a situações que possuem regulação legislativa própria, como no direito sucessório (REsp 1.472.945-RJ, Terceira Turma, DJe de 19/11/2014). Por fim, ressalte-se que essa linha exegética é a mesma chancelada no Enunciado 270 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na III Jornada de Direito Civil. Precedente citado: REsp 974.241-DF, Quarta Turma, DJe 5/10/2011. REsp 1.368.123-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, Rel. para acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 22/4/2015, DJe 8/6/2015.
O Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos individuais homogêneos dos beneficiários do seguro DPVAT. Isso porque o STF, ao julgar o RE 631.111-GO (Tribunal Pleno, DJe 30/10/2014), submetido ao rito do art. 543-B do CPC, firmou o entendimento de que Órgão Ministerial tem legitimidade para ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos individuais homogêneos dos beneficiários do seguro DPVAT, dado o interesse social qualificado presente na tutela jurisdicional das vítimas de acidente de trânsito beneficiárias pelo DPVAT, bem como as relevantes funções institucionais do MP. Consequentemente, é imperioso o cancelamento da súmula 470 do STJ, a qual veicula entendimento superado por orientação jurisprudencial do STF firmada em recurso extraordinário submetido ao rito do art. 543-B do CPC. REsp 858.056-GO, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 27/5/2015, DJe 5/6/2015.
Não cabe a condenação da Fazenda Pública em honorários advocatícios no caso em que o credor simplesmente anui com os cálculos apresentados em "execução invertida", ainda que se trate de hipótese de pagamento mediante Requisição de Pequeno Valor (RPV). É certo que o STJ possui entendimento de ser cabível a fixação de verba honorária nas execuções contra a Fazenda Pública, ainda que não embargadas, quando o pagamento da obrigação for feito mediante RPV. Entretanto, a jurisprudência ressalvou que, nos casos de "execução invertida", a apresentação espontânea dos cálculos após o trânsito em julgado do processo de conhecimento, na fase de liquidação, com o reconhecimento da dívida, afasta a condenação em honorários advocatícios. Precedentes citados: AgRg no AREsp 641.596-RS, Segunda Turma, DJe 23/3/2015; e AgRg nos EDcl no AREsp 527.295-RS, Primeira Turma, DJe 13/4/2015. AgRg no AREsp 630.235-RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 19/5/2015, DJe 5/6/2015.
Na ação de execução fiscal, frustradas as diligências para localização de outros bens em nome do devedor e obedecida a ordem legal de nomeação de bens à penhora, não cabe ao magistrado recusar a constrição de bens nomeados pelo credor fundamentando a decisão apenas na assertiva de que a potencial iliquidez deles poderia conduzir à inutilidade da penhora. Isso porque, nos termos do art. 612 do CPC, a execução é realizada no interesse do credor que adquire, pela penhora, o direito de preferência sobre os bens indicados. Ademais, conforme preceitua o art. 591 do CPC, todo o patrimônio presente e futuro do devedor pode ser utilizado para pagamento de débitos. REsp 1.523.794-RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 19/5/2015, DJe 1º/6/2015.
No caso em que a garantia à execução fiscal tenha sido totalmente dispensada de forma expressa pelo juízo competente - inexistindo, ainda que parcialmente, a prestação de qualquer garantia (penhora, fiança, depósito, seguro-garantia) -, o prazo para oferecer embargos à execução deverá ter início na data da intimação da decisão que dispensou a apresentação de garantia, não havendo a necessidade, na intimação dessa dispensa, de se informar expressamente o prazo para embargar. De fato, o STJ já reconheceu, em sede de recurso representativo da controvérsia (REsp 1.127.815-SP, Primeira Seção, DJe 14/12/2010), que a insuficiência patrimonial do devedor inequívoca e devidamente comprovada é justificativa plausível à apreciação dos embargos à execução sem que o executado proceda ao reforço da penhora. A toda evidência, pelas mesmas razões, essa compreensão abrange os casos em que a dispensa de apresentação de garantia é total. Acerca de situações nas quais houve garantia apresentada (penhora, fiança, depósito, seguro-garantia), ainda que parcial, a jurisprudência do STJ tem determinado qual seria o respectivo termo inicial do prazo para o oferecimento de embargos do devedor: intimação do depósito, da penhora, da aceitação do seguro-garantia etc. Nesse contexto, nota-se que a regra subjacente a todos estes casos é a de que o prazo para o oferecimento de embargos do devedor tem início na data da intimação do ato que caracteriza a informação aos atores processuais da existência da garantia - nascimento da aptidão para embargar, pois não se embarga o ato constritivo, mas a execução -, tendo em vista o disposto no caput do art. 16 da Lei 6.830/1980. Do mesmo modo, nos casos em que a dispensa de apresentação de garantia é total, o prazo para oferecer embargos à execução fiscal deverá ter início na data da intimação da decisão que dispensou a apresentação de garantia, já que é este o ato que caracteriza a informação aos atores processuais da desnecessidade da garantia e a aptidão para embargar. Trata-se, portanto, de aplicação por analogia do disposto no mesmo art. 16 da Lei 6.830/1980. Ademais, não faz qualquer sentido a aplicação analógica do art. 738, do CPC - segundo o qual "Os embargos serão oferecidos no prazo de 15 (quinze) dias, contados da data da juntada aos autos do mandado de citação" -, posto que, na data da juntada aos autos do mandado de citação do feito executivo, o executado não tem conhecimento de que foi dispensada a garantia e de que já está apto a embargar. Além disso, não há necessidade, na intimação da dispensa de garantia, de se informar expressamente o prazo para embargar. Até porque não se pode olvidar que a garantia do juízo é dispensada justamente com o propósito de permitir ao executado oferecer embargos à execução. Desse modo, seria de todo incompreensível se, intimado da desnecessidade dessa garantia, não houvesse prazo a ser cumprido para embargar, criando uma condição perene à efetividade do feito executivo e contrariando a segurança jurídica. REsp 1.440.639-PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 2/6/2015, DJe 10/6/2015.
Até o advento da Lei 12.844/2013, os valores ressarcidos no âmbito do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (REINTEGRA) incorporavam a base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, sobretudo no caso de empresas tributadas pelo lucro real na sistemática da não cumulatividade do PIS e da COFINS instituída pelas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003. A Lei 12.546/2011, que institui o REINTEGRA, tem como objetivo reintegrar valores referentes a custos tributários federais residuais existentes nas cadeias de produção de tais empresas. A propósito, extrai-se dos arts. 1º e 2º dessa lei, que esse benefício fiscal tem natureza de "reintegração de valores referentes a custos tributários". Dessa forma, seja por se tratar de recuperação ou devolução de custos, seja por se tratar de subvenção corrente para custeio ou operação, os valores do benefício fiscal criado pelo REINTEGRA integram a receita bruta operacional da empresa por expressa determinação do art. 44 da Lei 4.506/1964, de forma que, salvo autorizativo legal, tais valores integram a base de cálculo do PIS e da COFINS no regime da não cumulatividade previsto nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003. A propósito, conforme entendimento adotado pela Segunda Turma desta Corte nos autos dos EDcl no REsp 1.462.313-RS, DJe 19/12/2014 e do AgRg no REsp 1.518.688-RS, DJe 7/5/2015, os valores do REINTEGRA são passíveis de incidência do imposto de renda, até o advento da MP 651/2014, posteriormente convertida na Lei 13.043/2014, de forma que a conclusão lógica que se tem é a de que tais valores igualmente integram a base de cálculo do PIS e da COFINS, que é mais ampla e inclui, a priori, ressalvadas as deduções legais, os valores relativos ao IRPJ e à CSLL, sobretudo no caso de empresas tributadas pelo lucro real na sistemática da não cumulatividade do PIS e da COFINS instituída pelas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, cuja tributação se dá com base na receita bruta mensal da pessoa jurídica, a qual, por expressa disposição do art. 44 da Lei 4.506/1964, abrange as recuperações ou devoluções de custos, deduções ou provisões e as subvenções correntes, para custeio ou operação, recebidas de pessoas jurídicas de direito público ou privado, ou de pessoas naturais. Nos termos do art. 150, § 6º, da CF, qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição. Nesse sentido, somente com o advento da Lei 12.844/2013, que incluiu o § 12 no art. 2º da Lei 12.546/2011, é que os valores ressarcidos no âmbito do REINTEGRA foram excluídos expressamente da base de cálculo do PIS e da COFINS. Por não se tratar de dispositivo de conteúdo meramente procedimental, mas sim de conteúdo material (exclusão da base de cálculo de tributo), sua aplicação somente alcança os fatos geradores futuros e aqueles cuja ocorrência não tenha sido completada (consoante o art. 105 do CTN), não havendo que se falar em aplicação retroativa. REsp 1.514.731-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 26/5/2015, DJe 1º/6/2015.
O filho do autor da herança tem o direito de exigir de seus irmãos a colação dos bens que receberam via doação a título de adiantamento da legítima, ainda que sequer tenha sido concebido ao tempo da liberalidade. De fato, para efeito de cumprimento do dever de colação, é irrelevante se o herdeiro nasceu antes ou após a doação, não havendo também diferença entre os descendentes, se são eles irmãos germanos ou unilaterais ou se supervenientes à eventual separação ou divórcio do doador. O que deve prevalecer é a ideia de que a doação feita de ascendente para descendente, por si só, não é considerada inválida ou ineficaz pelo ordenamento jurídico, mas impõe ao donatário obrigação protraída no tempo, de à época do óbito do doador, trazer o patrimônio recebido à colação, a fim de igualar as legítimas, caso não seja aquele o único herdeiro necessário (arts. 2.002, parágrafo único, e 2.003 do CC). Importante destacar que o dever de colacionar os bens recebidos a título de liberalidade só se dispensa por expressa manifestação do doador, determinando que a doação seja extraída da parte disponível de seus bens, o que também não ocorre na hipótese em análise, na qual a liberalidade de fato configura adiantamento da legítima. Precedentes citados: REsp 730.483-MG, Terceira Turma, DJ 20/6/2005; e REsp 9.081-SP, Terceira Turma, DJ 20/4/1992. REsp 1.298.864-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/5/2015, DJe 29/5/2015.
É quinquenal o prazo prescricional para a propositura de ação indenizatória ajuizada por vítima de acidente de trânsito contra concessionária de serviço público de transporte coletivo. De fato, o STJ tem sustentado o entendimento de que é trienal (art. 206, § 3º, V, do CC) - e não quinquenal - o prazo prescricional para a propositura desse tipo de ação (AgRg nos EDcl no Ag 1.386.124-SP, Terceira Turma, DJe 29/6/2011; e AgRg no Ag 1.195.710-RS, Quarta Turma, DJe 1º/8/2012). Todavia, esse posicionamento merece ser revisado, uma vez que o art. 1º-C da Lei 9.494/1997, que se encontra em vigor e que é norma especial em relação ao Código Civil, determina que "Prescreverá em cinco anos o direito de obter indenização dos danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos". Ademais, frise-se que não se trata de aplicar à concessionária de serviço público o disposto no Decreto 20.910/1932, que dispõe sobre a prescrição contra a Fazenda Pública, mas sim de utilizar a regra voltada especificamente para as hipóteses de danos causados por agentes da administração direta e indireta. REsp 1.277.724-PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 26/5/2015, DJe 10/6/2015.
Não é lícito aos conviventes atribuírem efeitos retroativos ao contrato de união estável, a fim de eleger o regime de bens aplicável ao período de convivência anterior à sua assinatura. Inicialmente, registre-se, acerca dos efeitos do contrato de união estável, que doutrinadores renomados sustentam que, na união estável, é possível a alteração, a qualquer tempo, das disposições de caráter patrimonial, inclusive com efeitos retroativos, mediante singelo acordo despido de caráter patrimonial, sob o argumento de que deve prevalecer o princípio da autonomia da vontade. Não obstante essa vertente doutrinária, o art. 1.725 do CC não comporta o referido alcance. Com efeito, o mencionado dispositivo legal autoriza que os conviventes formalizem suas relações patrimoniais e pessoais por meio de contrato e que somente na ausência dele aplicar-se-á, no que couber, o regime de comunhão parcial. Em síntese: enquanto não houver a formalização da união estável, vigora o regime da comunhão parcial, no que couber. O contrato de convivência, no entanto, não pode conceder mais benefícios à união estável do que ao casamento, pois o legislador constitucional, apesar de reconhecer os dois institutos como entidade familiar e lhes conferir proteção, não os colocou no mesmo patamar, pois expressamente dispôs que a lei facilitará a conversão daquele neste (§ 3º do art. 226 da CF). Portanto, como o regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento (§ 1º do art. 1.639 do CC) e a modificação dele somente é permitida mediante autorização judicial requerida por ambos os consortes, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvado o direito de terceiros (§ 3º do art. 1.639 do CC), não se vislumbra como o contrato de convivência poderia reconhecer uma situação que o legislador, para o casamento, enuncia a necessidade da intervenção do Judiciário. Até porque, admitir o contrário seria conferir, sem dúvida, mais benefícios à união estável do que ao matrimônio civil, bem como teria o potencial de causar prejuízo a direito de terceiros que porventura tivessem contratado com os conviventes. REsp 1.383.624-MG, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 2/6/2015, DJe 12/6/2015.
É lícita a cláusula estatutária que prevê a rescisão do vínculo laboral com o patrocinador como condição para o resgate de reserva de poupança de plano privado de previdência complementar de entidade fechada. De antemão, é importante esclarecer que resgate é o instituto da previdência complementar que faculta ao ex-participante receber o valor decorrente do desligamento do plano de benefícios. Já o montante a ser restituído corresponde à totalidade das contribuições por ele vertidas ao fundo (reserva de poupança), devidamente atualizadas, descontadas as parcelas de custeio administrativo que sejam de sua responsabilidade, na forma prevista no regulamento. De fato, o instituto do resgate, além de ser disciplinado no regulamento do ente de previdência privada, deve observar também, segundo comando legal, as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador (arts. 3º, II, 35, I, "c" e "d", e 42, V, da Lei 6.435/1977; art. 14, caput e III, da LC 109/2001). Nesse contexto, o Conselho de Gestão da Previdência Complementar (CGPC), no uso de suas atribuições legais (arts. 5º e 74 da LC 109/2001), editou a Resolução MPS/CGPC 6/2003, dispondo que no caso de plano de benefícios instituído por patrocinador, o regulamento deverá condicionar o resgate à cessação do vínculo empregatício (art. 22). Ressalta-se que essa exigência já fazia parte do regime da Lei 6.435/1977, regulamentada pelo Decreto 81.240/1978 (art. 31, VII e VIII). Observa-se, desse modo, que a exigência de extinção do vínculo empregatício com o patrocinador para o ex-participante de fundo previdenciário solicitar o resgate de suas contribuições, apesar de rigorosa, é essencial, pois se evita a desnaturação do sistema, dado que o objetivo da previdência complementar fechada é a proteção social de um grupo específico de participantes e não a utilização como forma de investimento, tanto é assim que a atividade da entidade fechada de previdência complementar não tem finalidade lucrativa, estando voltada unicamente para a gestão de recursos para fazer frente à suplementação de benefícios futuros contratados. Logo, não fere a razoabilidade nem há como ser reputada ilícita ou abusiva a cláusula estatutária. REsp 1.518.525-SE, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 19/5/2015, DJe 29/5/2015.
Acionistas e companhia podem litigar em litisconsórcio facultativo ativo em ação de responsabilidade civil contra o administrador pelos prejuízos causados ao patrimônio da sociedade anônima (art. 159 da Lei 6.404/1976), quando não proposta a ação pela companhia no prazo de três meses após a deliberação da assembleia-geral (§ 3º). Da análise do art. 159 da Lei 6.404/1976, constata-se que a denominada ação social, assim compreendida como aquela voltada a reparar danos causados à própria sociedade anônima pela atuação ilícita de seus administradores, pode ser promovida: i) pela própria companhia (ação social ut universi), desde que devidamente autorizada por sua assembleia geral; e ii) por qualquer acionista, caso a demanda não seja intentada pela companhia nos três meses seguintes à deliberação assemblear, ou por acionistas que representem ao menos 5% (cinco por cento) do capital social, na hipótese em que a assembleia geral tenha deliberado por não acionar os administradores (em ambos os casos, tem-se a denominada ação social ut singuli). Na ação social ut singuli, o acionista que a promove o faz em nome próprio, na defesa dos direitos e interesses da companhia. Está-se, pois, diante de uma legitimação extraordinária. Aliás, o § 5º do artigo sob exame, de modo a explicitar tal circunstância, deixa claro que o resultado obtido com a demanda é deferido à sociedade, e não ao acionista promovente. Preceitua o dispositivo legal, ainda, que o acionista demandante será indenizado por todas as despesas que suportar com o processo, nos limites do resultado. Por consectário, caso o resultado da demanda seja negativo, o autor responde pessoalmente pelas despesas processuais. Além disso, o preceito legal ainda dispõe em seu § 7º sobre a possibilidade de qualquer acionista ou terceiro promover ação destinada a reparar prejuízo próprio (e não da sociedade anônima, ressalta-se), ocasionado por ato de administrador. É a denominada ação individual, que, ante a diversidade de objetos, não se confunde com a ação social acima discriminada. De outro lado, é de se constatar que, durante os três meses contados da deliberação da assembleia geral que autoriza a companhia a promover a ação contra o administrador, somente a própria sociedade, com exclusão de qualquer outro acionista, pode assim proceder. No curso de tal interregno, portanto, a lei confere legitimidade exclusiva à sociedade anônima para promover a ação social. Após o término do aludido termo, o regramento legal expressamente admite que qualquer acionista promova a ação social, caso a companhia não o tenha feito naquele período. Veja-se, portanto, que, em tal circunstância - após o término dos três meses contados da deliberação assemblear - possuem legitimidade ativa ad causam tanto a companhia, como qualquer acionista para promover a ação social. Está-se, pois, nesse caso, diante de legitimidade concorrente - que se dá tanto na seara ordinária, como na extraordinária -, a considerar que ambos, tanto a companhia, como qualquer acionista, estão, por lei, autorizados a discutir em juízo a presente situação jurídica (consistente na reparação de danos sofridos pela companhia por ato de administrador). Como é de sabença, na legitimidade concorrente simples ou isolada, qualquer dos legitimados pode atuar sozinho no feito. Naturalmente, em se tratando de legitimidade extraordinária, caso o titular do direito (a companhia) promova a ação isoladamente, o posterior ajuizamento de ação pelo substituto processual (qualquer acionista) consubstanciará, inequivocamente, caso de litispendência. Veja-se, que, nessa hipótese, a ação posterior deve ser extinta em virtude da existência de ação anterior idêntica, e não porque, ao substituto processual, falta legitimidade. De se destacar, ainda, que, efetivamente, não há qualquer óbice legal para a formação de um litisconsórcio ativo facultativo integrado por sujeitos de direito que, repisa-se, simultaneamente ostentam legitimidade (concorrente) para, em juízo, defender os interesses da companhia. Pode-se antever, como inarredável consequência de tal proceder, no máximo, que os autores da ação, caso não logrem êxito em seu intento, venham a arcar, cada qual, com as despesas processuais decorrentes da sucumbência em partes iguais. De todo modo, havendo expressa previsão legal a conferir legitimidade aos acionistas para ajuizarem ação social, após três meses da deliberação da assembleia, possível, inclusive, a formação de litisconsórcio facultativo ativo entre a companhia e aqueles. REsp 1.515.710-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 12/5/2015, DJe 2/6/2015.
Ainda que o domicílio do autor da herança seja o Brasil, aplica-se a lei estrangeira da situação da coisa - e não a lei brasileira - na sucessão de bem imóvel situado no exterior. A LINDB, inegavelmente, elegeu o domicílio como relevante regra de conexão para solver conflitos decorrentes de situações jurídicas relacionadas a mais de um sistema legal (conflitos de leis interespaciais), porquanto consistente na própria sede jurídica do indivíduo. Assim, a lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o direito ao nome, a capacidade jurídica e dos direitos de família (art. 7º). Por sua vez, a lei do domicílio do autor da herança regulará a correlata sucessão, nos termos do art. 10 da lei sob comento. Em que pese a prevalência da lei do domicílio do indivíduo para regular as suas relações jurídicas pessoais, conforme preceitua a LINDB, esta regra de conexão não é absoluta. Como bem pondera a doutrina, outros elementos de conectividade podem, a depender da situação sob análise, revelarem-se preponderantes e, por conseguinte, excepcionar a aludida regra, tais como a situação da coisa, a faculdade concedida à vontade individual na escolha da lei aplicável, quando isto for possível, ou por imposições de ordem pública. Esclarece, ainda, que "a adoção de uma norma de direito estrangeiro não é mera concessão do Estado, ou um favor emanado de sua soberania, mas a consequência natural da comunidade de direito, de tal forma que a aplicação da lei estrangeira resulta como imposição de um dever internacional. Especificamente à lei regente da sucessão, pode-se assentar, de igual modo, que o art. 10 da LINDB, ao estabelecer a lei do domicílio do autor da herança para regê-la, não assume caráter absoluto. A conformação do direito internacional privado exige, como visto, a ponderação de outros elementos de conectividade que deverão, a depender da situação, prevalecer sobre a lei de domicílio do de cujus. Além disso, outras duas razões - a primeira de ordem legal; a segunda de ordem prática - corroboram com a conclusão de relatividade do disposto no art. 10, caput, da LINDB. No tocante ao primeiro enfoque, o dispositivo legal sob comento deve ser analisado e interpretado sistematicamente, em conjunto, portanto, com as demais normas internas que regulam o tema, em especial o art. 8º, caput, e § 1º do art. 12, ambos da LINDB e o art. 89 do CPC. E, o fazendo, verifica-se que, na hipótese de haver bens imóveis a inventariar situados, simultaneamente, aqui e no exterior, o Brasil adota o princípio da pluralidade dos juízos sucessórios. Como se constata, a própria LINDB, em seu art. 8º, dispõe que as relações concernentes aos bens imóveis devem ser reguladas pela lei do país em que se encontrem. Inserem-se, inarredavelmente, no espectro de relações afetas aos bens imóveis aquelas destinadas a sua transmissão/alienação, seja por ato entre vivos, seja causa mortis, cabendo, portanto, à lei do país em que situados regê-las. Por sua vez, o CPC, em seu art. 89 (abrangendo disposição idêntica à contida no § 2º do art. 12 da LINDB), é expresso em reconhecer que a jurisdição brasileira, com exclusão de qualquer outra, deve conhecer e julgar as ações relativas aos imóveis situados no país, assim como proceder ao inventário e partilha de bens situados no Brasil, independente do domicílio ou da nacionalidade do autor da herança. Sobressai, no ponto, a insubsistência da tese de que o Juízo sucessório brasileiro poderia dispor sobre a partilha de bem imóvel situado no exterior. Como assinalado, não resta sequer instaurada a jurisdição brasileira para deliberar sobre bens imóveis situados no estrangeiro, tampouco para proceder a inventario ou à partilha de bens imóveis sitos no exterior. O solo, em que se fixam os bens imóveis, afigura-se como expressão da própria soberania de um Estado e, como tal, não pode ser, sem seu consentimento ou em contrariedade ao seu ordenamento jurídico, objeto de ingerência de outro Estado. No ponto, já se pode antever a segunda razão - esta de ordem prática - a justificar a assertiva de que o art. 10 da LINDB encerra, de fato, regramento que comporta exceções. É que um provimento judicial emanado do juízo sucessório brasileiro destinado a deliberar sobre imóvel situado no exterior, além de se afigurar inexistente, pois, como visto, não instaurada sequer sua jurisdição, não deteria qualquer eficácia em outro país, destinatário da "ordem" judicial. Aliás, dentre os princípios que regem o Direito Internacional Privado, ganha cada vez mais relevo o da eficácia das decisões ou do Estado com melhor competência, informador da competência da lex rei sitae (lei da situação da coisa) para regular as relações concernentes aos bens imóveis, pois esta é a lei, inarredavelmente, que guarda melhores condições de impor a observância e o acatamento de seus preceitos. Assim, em havendo bens imóveis a serem inventariados ou partilhados simultaneamente no Brasil e no estrangeiro, a premissa de que a lei do domicílio do de cujus, sempre e em qualquer situação, regulará a sucessão, somente poderia ser admitida na remota - senão inexistente - hipótese de o Estado estrangeiro, cujas leis potencialmente poderiam reger o caso (em virtude de algum fator de conexão, v.g., situação da coisa, existência de testamento, nacionalidade, etc), possuir disposição legal idêntica à brasileira. Mais do que isso. Seria necessário que, tanto o Brasil, em que domiciliado a autora da herança, assim como o país estrangeiro, país em que situado o imóvel a ser inventariado, adotassem o princípio da unidade ou universalidade do juízo da sucessão e que, em ambos os países, o juízo sucessório fosse (com prejuízo de qualquer outra regra de conexão) o do domicílio do autor da herança. Todavia, em se tratando de bem imóvel situado no estrangeiro, circunstância que se relaciona diretamente com a própria soberania do Estado, difícil, senão impossível, cogitar a hipótese de este mesmo Estado estrangeiro dispor que a sucessão deste bem, nele situado, fosse regulada pela lei de outro país. No ordenamento jurídico nacional (art. 8º, caput, da LINDB, em conjunto com o art. 89 do CPC - abrangendo disposição idêntica à contida no § 2º do art. 12 da LINDB), tal hipótese seria inadmissível. A exegese ora propugnada, encontra ressonância na especializada doutrina, que bem esclarece a inidoneidade (e mesmo ineficácia) do critério unitário para reger a sucessão de bens imóveis situados em mais de um Estado, em claro descompasso com as demais normas internas que tratam do tema. Ademais, a jurisprudência do STJ, na linha da doutrina destacada, já decidiu que, "Adotado no ordenamento jurídico pátrio o princípio da pluralidade de juízos sucessórios, inviável se cuidar, em inventário aqui realizado, de eventuais depósitos bancários existentes no estrangeiro." (REsp 397.769-SP, Terceira Turma, DJ 19/12/2002). REsp 1.362.400-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 28/4/2015, DJe 5/6/2015.
A caução prevista no art. 835 do CPC não tem natureza cautelar, sendo exigível no caso em que se verificar a presença dos requisitos objetivos e cumulativos elencados no referido dispositivo, podendo ser dispensada nas hipóteses previstas no art. 836 do CPC ou quando, com base na prova dos autos, as peculiaridades do caso concreto indicarem que a sua exigência irá obstaculizar o acesso à jurisdição. Com efeito, para que a caução prevista no art. 835 do CPC seja exigível são necessários dois pressupostos objetivos e cumulativos, a saber: (i) o autor da ação não residir no Brasil ou dele se ausentar na pendência da demanda; e (ii) não ter o autor da ação bens imóveis no Brasil que assegurem o pagamento das custas e honorários de advogado da parte contrária em caso de sucumbência. Esclareça-se que o referido dispositivo legal, a despeito de estar inserido no livro do CPC referente aos procedimentos cautelares, não ostenta natureza cautelar. O tema relaciona-se, de fato, com as despesas processuais. Logo, para a sua incidência, não se exige a presença do fumus boni iuris ou do periculum in mora, mas, sim, a configuração de requisitos objetivos que elenca. Nota-se que o legislador não conferiu qualquer margem de discricionariedade ao magistrado para que dispense a prestação da caução com base em critérios subjetivos - como, por exemplo, a plausibilidade do direito em que se funda a ação - porque não se trata de faculdade, mas de imposição legal. Nesse passo, registre-se que não se encontra eleito pelo legislador (art. 835 do CPC) critério de índole eminentemente subjetiva para averiguação da necessidade de prestação de caução nem se verifica o referido critério entre as exceções do art. 836 do CPC ("Não se exigirá, porém, a caução, de que trata o artigo antecedente: I - na execução fundada em título extrajudicial; II - na reconvenção."). Entretanto, como o não atendimento da prestação de caução constitui um obstáculo processual ao prosseguimento da demanda - visto que, se não removido, impõe a extinção do processo sem resolução do mérito -, não se pode afastar por completo a possibilidade de, excepcionalmente, diante das peculiaridades de determinado caso concreto, dispensar-se a caução quando, com base na prova dos autos, conclua-se pela existência de efetivo obstáculo concreto ao acesso à jurisdição. REsp 1.479.051-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 26/5/2015, DJe 5/6/2015.
Em execução de dívida divisível do autor da herança ajuizada após a partilha, cada herdeiro beneficiado pela sucessão responde na proporção da parte que lhes coube na herança. De fato, os herdeiros e legatários do autor da herança não respondem pelas dívidas do de cujus acima das forças dos bens que receberam. Dessarte, com a abertura da sucessão, há a formação de um condomínio necessário, que somente é dissolvido com a partilha, estabelecendo o quinhão hereditário de cada beneficiário no tocante ao acervo transmitido. Nesse contexto, a herança é constituída pelo acervo patrimonial e dívidas (obrigações) deixadas por seu autor, sendo que aos credores do autor da herança é facultada, antes da partilha dos bens transmitidos, a habilitação de seus créditos no juízo do inventário ou o ajuizamento de ação em face do espólio. Ultimada a partilha, o acervo outrora indiviso, constituído pelos bens e direitos que pertenciam ao de cujus, transmitidos com o seu falecimento, estará discriminado e especificado, de modo que só caberá ação em face dos beneficiários, que, em todo caso, responderão até o limite de seus quinhões. Com efeito, é nítido do exame do art. 1.997, caput, do CC, c/c o art. 597 do CPC (correspondente ao art. 796 do novo CPC) que, feita a partilha, cada herdeiro responde pelas dívidas (divisíveis) do falecido dentro das forças da herança e na proporção da parte que lhe coube, e não necessariamente no limite de seu quinhão hereditário. Portanto, após a partilha, não há cogitar em solidariedade entre os herdeiros de dívidas divisíveis, motivo pelo qual caberá ao credor executar os herdeiros pro rata, observando a proporção da parte que lhes coube (quinhão) no tocante ao acervo partilhado. Precedente citado: REsp 1.290.042-SP, Sexta Turma, DJe 29/2/2012. REsp 1.367.942-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 21/5/2015, DJe 11/6/2015.
É lícita a cláusula que prevê a rescisão do vínculo laboral com o patrocinador como condição para o resgate da totalidade das contribuições vertidas ao plano privado de previdência complementar de entidade fechada. A LC 109/2001, embora preveja que os regulamentos dos planos de benefícios deverão estabelecer o resgate da totalidade das contribuições vertidas pelo ex-participante, dispõe que caberá aos órgãos públicos regulador e fiscalizador estabelecer regulamentação específica acerca do referido instituto. Nessa conjuntura, a norma infralegal editada pelo órgão regulador, dentro do exercício do poder regulamentar, que disciplina atualmente a forma pela qual será efetuado o "resgate da totalidade das contribuições vertidas ao plano pelo participante", prevista na lei complementar de regência - vinculando as entidades de previdência privada e participantes -, é a Resolução do Conselho de Gestão da Previdência Complementar 6, de 30 de outubro de 2003. Pois bem, o art. 22 da referida Resolução enuncia que: "No caso de plano de benefícios instituído por patrocinador, o regulamento deverá condicionar o pagamento do resgate à cessação do vínculo empregatício". Portanto, nos planos de benefícios patrocinados, é lícita a disposição regulamentar que estabelece como requisito ao resgate a cessação do vínculo empregatício com o patrocinador. REsp 1.189.456-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 12/5/2015, DJe, 11/6/2015.
O fato de produto elaborado e fabricado no Brasil ser destinado exclusivamente ao mercado externo não implica a caducidade do respectivo registro de marca por desuso. De acordo com a Lei de Propriedade Industrial, uma vez passados cinco anos da concessão do registro, se requerida a sua caducidade, deve o titular da marca demonstrar que, na data do requerimento, já iniciou seu uso no Brasil, ou que, ainda que interrompido o seu uso, a interrupção não ultrapassou mais de cinco anos consecutivos, ou que não tenha, nesse prazo, feito uso com modificação que implique alteração de seu caráter distintivo original, sem a apresentação de razões legítimas. Se o titular da marca registrada no Brasil industrializa, fabrica, elabora o produto em território nacional, claramente inicia e faz uso da marca no Brasil, merecendo toda proteção legal, pois aqui empreende, gerando produção, empregos e riqueza, sendo indiferente que a mercadoria aqui produzida seja destinada ao mercado interno ou exclusivamente ao externo. Produzir no País o produto com a marca aqui registrada atende suficientemente ao requisito legal de "uso da marca iniciado no Brasil". REsp 1.236.218-RJ, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 5/2/2015, DJe 11/6/2015.
É possível que se reconheça a caducidade do registro da marca quando, em um período de cinco anos, o valor e o volume de vendas do produto relacionado à marca forem inexpressivos (na situação em análise, 70 pacotes de cigarros que geraram receita de R$ 614,75) em comparação com operações bilionárias realizadas pelo titular no mesmo período (produção de mais de 400 bilhões de cigarros). De acordo com a Lei de Propriedade Industrial, uma vez passados cinco anos da concessão do registro, se requerida a sua caducidade, deve o titular da marca demonstrar que, na data do requerimento, já iniciou seu uso no Brasil, ou que, ainda que interrompido o seu uso, a interrupção não ultrapassou mais de cinco anos consecutivos, ou que não tenha, nesse prazo, feito uso com modificação que implique alteração de seu caráter distintivo original, sem a apresentação de razões legítimas. Quanto ao uso efetivo da marca, a doutrina esclarece que "A Lei não define - e com razão - os atos que hão de constituir uso. O uso é noção intuitiva: usar é exercitar, por em funcionamento. Ao uso, que é uma atividade (= ação), contrapõe-se o desuso, que é, em essência, uma atitude neutra (= omissão). Ambos, uso e desuso, são fatos jurígenos, gerando consequências no campo do Direito. Usar, no sentido que o direito de propriedade industrial empresta a esse verbo, é projetar a marca para o mundo, para que ela, antes mera potencialidade, passe a exercer a função a que se destina. A Lei anterior, ao prever a extinção do registro como sanção para o desuso, empregava o termo uso efetivo. A Lei nova não repete o adjetivo, falando apenas de uso, sem qualquer qualificação. Muito embora o adjetivo 'efetivo' dê acento à realidade do uso, nem por isso nos parece autorizada a conclusão de que a sua ausência leve à aceitação de qualquer uso. É que, em função de sua categoria ôntica, as marcas só podem ser consideradas em uso quando 'ionizem' os bens ou serviços a que se destinem, carregando, simbolicamente, informações sobre eles e comunicando-as ao público. O fio condutor do exame de suficiência de uso é a atuação do titular no sentido de por a sua marca diante do público". Assim, no caso em análise, o uso esporádico da marca, com escassas negociações no mercado, é inexpressivo dentro da magnitude das operações bilionárias realizadas pela empresa, portanto, insuficiente para configurar e comprovar o uso efetivo da marca apto a afastar a caducidade por desuso. REsp 1.236.218-RJ, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 5/2/2015, DJe 11/6/2015.
Nos crimes sexuais contra vulnerável, a inexistência de registro de nascimento em cartório civil não é impedimento a que se faça a prova de que a vítima era menor de 14 anos à época dos fatos. De início, ressalte-se que a norma processual inscrita no art. 155, parágrafo único, do CPP estabelece que o juiz, no exercício do livre convencimento motivado, somente quanto ao estado das pessoas observará as restrições estabelecidas na lei civil. Ao enfrentar a questão, a Terceira Seção do STJ assentou a primazia da certidão de nascimento da vítima para tanto (EREsp 762.043-RJ, DJe 4/3/2009). Porém, o STJ tem considerado que a mera ausência da certidão de nascimento não impede a verificação etária, quando coligidos outros elementos hábeis à comprovação da qualidade de infante da vítima (HC 81.181-SP, Quinta Turma, DJe 21/6/2010 e AgRg no AREsp 114.864-DF, Sexta Turma, DJe 3/10/2013). AgRg no AREsp 12.700-AC, voto vencedor Rel. Min. Walter de Almeida Guilherme (Desembargador convocado do TJ/SP), Rel. para acórdão Min. Gurgel de Faria, julgado em 10/3/2015, DJe 5/6/2015.
Na primeira fase da dosimetria da pena, o excesso de velocidade não deve ser considerado na aferição da culpabilidade (art. 59 do CP) do agente que pratica delito de homicídio e de lesões corporais culposos na direção de veículo automotor. O excesso de velocidade não constitui fundamento apto a justificar o aumento da pena-base pela culpabilidade, por ser inerente aos delitos de homicídio culposo e de lesões corporais culposas praticados na direção de veículo automotor, caracterizando a imprudência, modalidade de violação do dever de cuidado objetivo, necessária à configuração dos delitos culposos. AgRg no HC 153.549-DF, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 2/6/2015, DJe 12/6/2015.
O juiz, na análise dos motivos do crime (art. 59 do CP), pode fixar a pena-base acima do mínimo legal em razão de o autor ter praticado delito de homicídio e de lesões corporais culposos na direção de veículo automotor, conduzindo-o com imprudência a fim de levar droga a uma festa. Isso porque o fim de levar droga a uma festa representa finalidade que desborda das razoavelmente utilizadas para esses crimes, configurando justificativa válida para o desvalor. AgRg no HC 153.549-DF, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 2/6/2015, DJe 12/6/2015.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME DO REINCIDENTE CONDENADO POR CRIME HEDIONDO.
A progressão de regime para os condenados por crime hediondo dar-se-á, se o sentenciado for reincidente, após o cumprimento de 3/5 da pena, ainda que a reincidência não seja específica em crime hediondo ou equiparado. Isso porque, conforme o entendimento adotado pelo STJ, a Lei dos Crimes Hediondos não faz distinção entre a reincidência comum e a específica. Desse modo, havendo reincidência, ao condenado deverá ser aplicada a fração de 3/5 da pena cumprida para fins de progressão do regime. Precedentes citados: HC 173.992-MS, Quinta Turma, DJe 10/5/2012, HC 273.774-RS, Rel. Quinta Turma, DJe 10/10/2014, HC 310.649-RS, Sexta Turma, DJe 27/2/2015. HC 301.481-SP, Rel. Min. Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 2/6/2015, DJe 11/6/2015.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi criado pela Constituição Federal de 1988 com a finalidade de preservar a uniformidade da interpretação das leis federais em todo o território brasileiro. Endereço: SAFS - Quadra 06 - Lote 01 - Trecho III. CEP 70095-900 | Brasília/DF. Telefone: (61) 3319-8000 | Fax: (61) 3319-8700. Home page: www.stj.jus.br
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. Informativo 563 do STJ - 2015 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 jul 2015, 08:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Informativos dos Tribunais/44815/informativo-563-do-stj-2015. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL
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